Nos últimos anos, a palavra burnout tem se tornado cada vez mais comum. Seja nas conversas sobre saúde mental, nas redes sociais ou nos tribunais trabalhistas, o tema aparece com frequência. Mas será que estamos entendendo realmente o que isso significa? Ou pior: será que estamos sendo levados a acreditar que esse esgotamento extremo é apenas uma questão individual, quando, na verdade, ele é um sintoma de algo muito maior?

Burnout não é só cansaço
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o burnout como um fenômeno ocupacional, caracterizado por exaustão extrema, distanciamento mental e perda da eficácia profissional. Não é apenas um dia ruim no trabalho ou uma fase difícil. Trata-se de um estado de colapso que pode levar a problemas físicos e mentais graves.
O que poucos discutem é como o burnout está diretamente ligado às condições estruturais do trabalho contemporâneo. O problema não é só seu – ele é um reflexo de um sistema de produção que exige mais do que os corpos e mentes podem suportar. Empresas terceirizam responsabilidades, pejotizam trabalhadores e transformam a exaustão em um selo de dedicação. No fim, os trabalhadores são descartáveis: quando não aguentam mais, são substituídos.
O problema do nexo causal
Um dos grandes desafios para o reconhecimento do burnout como uma doença ocupacional é o estabelecimento do nexo causal – ou seja, provar que a condição foi causada pelo ambiente de trabalho. Muitas empresas alegam que o problema tem origem na vida pessoal do trabalhador, dificultando que ele consiga afastamento ou indenização.
Isso revela um problema maior: o burnout não é tratado como uma falha do sistema, mas sim como um problema do indivíduo. Essa individualização do sofrimento impede que medidas efetivas sejam tomadas para transformar a estrutura do trabalho.
Redes sociais e a glamurização do burnout
Se, por um lado, a internet trouxe mais visibilidade para temas relacionados à saúde mental, por outro, criou uma cultura onde a exaustão virou um status.
Frases como “Se você não está cansado, não está se esforçando o suficiente” ou “Empreenda! Seja seu próprio chefe!” escondem uma realidade cruel: a precarização do trabalho disfarçada de liberdade. Influenciadores transformam transtornos psíquicos em identidade e promovem soluções simplistas, como um banho relaxante ou um dia de autocuidado, enquanto ignoram a raiz do problema.
O que pode ser feito?
A solução para o burnout não está em trabalhar a resiliência individual, mas em mudar a forma como o trabalho é organizado. Isso inclui:
- Regulamentação da carga de trabalho e combate à pejotização.
- Políticas públicas que protejam os direitos dos trabalhadores.
- Empresas que assumam a responsabilidade pela saúde mental de seus funcionários.
- Uma mudança cultural que normalize o descanso e a desconexão.
A exaustão não é normal
O burnout não deve ser visto como um rito de passagem para o sucesso, mas como um alerta de que algo está profundamente errado no mundo do trabalho. Precisamos parar de tratar a exaustão como mérito e começar a enxergá-la como um sintoma de um sistema que precisa mudar.
A pergunta que fica é: vamos continuar aceitando essa realidade ou chegou a hora de transformar o trabalho em algo realmente sustentável?